Há um descompasso em curso entre a escola e o mundo do trabalho que, em minha leitura, estava restrito ao Brasil, atingindo, no máximo, a América Latina. Em uma recente pesquisa envolvendo gestores das melhores universidades dos Estados Unidos, constatou-se que mais de 90% deles acredita que seus alunos são muito bem preparados para os desafios presentes nas empresas. Essa pesquisa também concluiu que mais de 80% dos executivos das principais empresas desse país relatam exatamente o contrário, que os egressos das universidades chegam muito mal preparados em situações básicas. As perguntas que ficam são: Esses profissionais estão em mundos diferentes? Há algo que podem fazer um pelo outro para que esse descompasso não aconteça? Até porque, em última instância, “na briga entre o mar e a pedra, quem apanha é o caranguejo”.
Esse descompasso é familiar à escola, desde as séries iniciais da Educação Básica. Ouvimos dizer que o problema é que a Educação Infantil não alfabetizou; ou que o 5º ano não ensinou a ler e a interpretar os problemas; ou que o Ensino Fundamental deixou passar para o Ensino Médio sem base nenhuma – e assim por diante. Quando chamaremos de fato à responsabilidade quem responde pelo descompasso? Continuaremos assistindo, em nome de um corporativismo docente ou algo que o valha, a trocas de partituras e instrumentos didáticos como paliativos para resolução do descompasso, sem quebrar verdadeiramente o ciclo equivocado de desresponsabilizações. Não quero dizer com isso que não possamos incluir os recursos didáticos na revisão do processo escolar. Mas há algo – na esfera da relação humana – que consome boa parte da energia profissional, que nem sempre se reverte em benefício educativo proveitoso para a sociedade e precisa ser central nas reflexões que envolvem a escola.
Faz-se necessário, para tanto, “se abrir para dentro” (criando canais de conexão com os alunos) e para fora (participando de avaliações oficiais e pesquisas de mercado), a fim de ajustar o compasso, preservando a acuidade como um tesouro, se pretendermos cultivar a sintonia com nosso tempo, com o tempo dos nossos alunos. Nossos jovens, por causa ou apesar de nós, são muito bons e, para a alegria da escola e do mundo do trabalho, no Brasil, melhores (na minha avaliação) que a maior parte do mundo.
Em pesquisa realizada pelo Instituto Internacional Universum, aplicada a jovens da geração Y em 23 países, entre eles o Brasil, é unanimidade entre todos os resultados do mundo que qualidade de vida (tempo para viver) é o que mais importa na carreira profissional. Em segundo lugar, para a surpresa geral das melhores escolas de administração que ditam as teorias econômicas globais, está o item trabalho estável e seguro. “O Brasil é um dos únicos países pesquisados onde a remuneração não está entre os dez atributos mais atrativos para os universitários”, disse André Valias Siqueira, até então, gerente da operação da Universum no país. E mais: quando o assunto é carreira, os jovens em nosso país, tidos como imediatista por muitos, pensam mais no longo prazo, diferentemente de jovens de outros países.
Por aqui, começar a carreira em uma empresa que seja uma referência para a trajetória profissional no futuro é o que mais pesa para os universitários. Desenvolvimento e oportunidades de crescimento também estão entre os principais atrativos. E, ainda, encontrar sentido na carreira, servindo a uma causa ou bem maior para a sociedade, é o terceiro principal objetivo dos jovens brasileiros. Diante do exposto, não nos cabe mais a pedagogia retroativa dos culpados, que, de tanto voltar no tempo, é capaz de apontar o pecado original, a maçã do paraíso, como a responsável pelos males. As organizações, nessa década, precisam rever a sua cultura e estudar muito esses jovens e os seus talentos, pois o que era importante nas décadas passadas parece já não ser mais. A busca por uma carreira de sucesso não faz mais sentido sem ter saúde e tempo para viver a vida, a família e seus ciclos sociais.